Angelo Carneiro
"Clinical Scales Do Not Reliably Identify Acute Ischemic Stroke Patients With Large-Artery Occlusion"
Neste estudo francês1 os autores aplicaram, retrospetivamente, uma série de escalas de avaliação clínica aos doentes com enfarte cerebral admitidos no seu hospital, tentando avaliar a capacidade destas escalas para prever a ocorrência de oclusão de um grande vaso.
Usando os limiares que permitiam uma maior acuidade diagnóstica (por exemplo, NIHSS ≥ 11), a taxa de falsos-negativos seria superior a 25%. Por forma a obter taxas de falsos-negativos da ordem dos 10%, os limiares teriam que ser bastante mais baixos (por exemplo, NIHSS ≥ 5).
Assim, usando um limiar mais alto ir-se-ia deixar de tratar (ou tratar mais tarde) quase um quarto dos doentes. Usando um limiar baixo iria significar que, na prática, quase todos os doentes com um défice neurológico focal teriam que ser enviados para um centro com capacidade de realizar trombectomia (diria, para um centro que dispõe de neurorradiologia de intervenção).
Este assunto tem sido bastante controverso, com outros autores a defenderem que estas escalas conseguirão predizer, com maior acuidade, quais os doentes com oclusão de grande vaso2.
A determinação de quais os doentes que têm oclusão de grande vaso é fulcral na orientação dos doentes com enfarte cerebral agudo, uma vez que só estes beneficiarão de trombectomia mecânica. Isto tem um impacto enorme na forma como os doentes são orientados, bem como na organização regional dos cuidados de saúde. Por um lado, não é viável (nem é desejável) que todos os hospitais prestem este serviço (trombectomia cerebral) porque, conforme ficou bem demonstrado nos ensaios clínicos, os centros de menor volume têm resultados menos bons. Por outro lado, orientar um doente com oclusão de um grade vaso para um hospital que não dispõe de trombectomia conduz a uma menor probabilidade de um bom resultado funcional, devido ao aumento do tempo entre o inicio dos sintomas e a recanalização. Note-se, por exemplo, que um estudo recente mostrou que, no intervalo de tempo que medeia a transferência inter-hospitalar, cerca de um terço dos doentes vê aumentar a sua área de enfarte estabelecido, com redução da pontuação na escala ASPECTS3.
A capacidade técnica de reabrir vasos ocluídos é já bastante alta; além disso, a seleção intra-hospitalar (com exames de imagem) de quais os doentes que podem beneficiar de trombectomia é cada vez mais precisa. Assim, a melhoria da orientação pré-hospitalar será, neste momento, o aspeto que pode permitir maiores ganhos em saúde.
1) Turc, Guillaume, et al. "Clinical Scales Do Not Reliably Identify Acute Ischemic Stroke Patients With Large-Artery Occlusion." Stroke (2016): STROKEAHA-116.
2) de la Ossa, Natalia Pérez, et al. "Design and Validation of a Prehospital Stroke Scale to Predict Large Arterial Occlusion The Rapid Arterial Occlusion Evaluation Scale." Stroke 45.1 (2014): 87-91.
3) Mokin, Maxim, et al. "ASPECTS decay during inter-facility transfer in patients with large vessel occlusion strokes." Journal of neurointerventional surgery (2016): neurintsurg-2016.